I- CONSIDERAÇÕES INICIAIS:
Antes dessa lei, o tráfico de pessoas somente se relacionava com questões de exploração sexual. As convenções internacionais não restringiam a isso,o que acarretou com a nova lei, se adequando às convenções.
Essa lei revogou o art. 231 e 231-A, criando o art. 149-A no Código Penal, não mais relacionada a apenas ao tráfico para relações sexuais.
Segundo o novo dispositivo, previsto no art. 149-A, configura o crime de tráfico de pessoas a conduta de agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de:
a) Remover órgãos, tecidos ou partes do corpo
b) Submeter a trabalho em condições análogas à de escravo
c) Submeter a qualquer tipo de servidão
d) Realizar adoção ilegal
e) Realizar exploração sexual
A pena para o crime é de reclusão, de 4 a 8 anos, e multa.
O §1º diz que a pena é aumentada de 1/3 até a 1/2 se:
- O crime for cometido por funcionário público no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las
- O crime for cometido contra criança, adolescente ou pessoa idosa ou com deficiência
- O agente se prevalecer de relações de parentesco, domésticas, de coabitação, de hospitalidade, de dependência econômica, de autoridade ou de superioridade hierárquica inerente ao exercício de emprego, cargo ou função
- A vítima do tráfico de pessoas for retirada do território nacional
Percebe-se que o tráfico de pessoas internacional passa a ser uma causa de aumento de pena de 1/3 a 2/3, assim como no tráfico de drogas internacional.
O §2º traz uma causa de diminuição de pena de 1/3 a 2/3, se o agente for primário e não integrar organização criminosa.
II- ELEMENTOS:
a) Sujeitos do crime
- O sujeito ativo do crime de tráfico de pessoas não exige condição especial do agente, sendo crime comum. Se for cometido por funcionário público a pena aumenta de 1/3 a 2/3.
- O sujeito passivo também é comum, podendo ser qualquer pessoa. Sendo vítima criança ou adolescente, ou ainda pessoa idosa ou com deficiência, a pena aumenta de 1/3 a 2/3.
b) Conduta
Trata-se de tipo misto alternativo, crime de ação múltipla que pode ser praticado mediante a prática de qualquer das condutas.
Há atos que denotam permanência, tais como transportar e alojar, casos em que a consumação se prolonga no tempo.
Somente haverá o crime se:
b.1) Cometido por meio de grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso;
b.2) Com a finalidade de remover órgãos, tecidos ou partes do corpo, submeter a trabalho em condições análogas à de escravo, submeter a qualquer tipo de servidão, realizar adoção ilegal ou realizar exploração sexual.
- Se não houver grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, não haverá o crime de tráfico de drogas.
- O Brasil considera que o consentimento válido da vítima exclui o crime. Admite-se o consentimento, mediante contraprestação.
c) Voluntariedade
O delito é punido a título de dolo, exigindo-se uma das seguintes finalidades especiais:
c.1) Remover órgãos, tecidos ou partes do corpo
c.2) Submeter a trabalho em condições análogas à de escravo
c.3) Submeter a qualquer tipo de servidão
c.4) Realizar adoção ilegal
c.5) Realizar exploração sexual
d) Consumação e tentativa
- O crime de tráfico de pessoas se consuma com qualquer um dos núcleos praticados, havendo alguns que se trata de crime permanente.
- O crime se consuma independentemente de o agente conseguir alcançar as suas finalidades especiais. Neste caso, poderá haver concurso material com outros crimes, caso alcance a finalidade.
- A tentativa é admissível.
e) Causa de aumento de pena
Atente-se que o crime terá sua pena aumentada de 1/3 a 2/3 se:
e.1) O crime cometido por funcionário público
e.2) O crime for cometido contra criança, adolescente ou pessoa idosa ou com deficiência
e.3) Houver prevalência de relações de parentesco, domésticas, de coabitação, de hospitalidade, de dependência econômica, de autoridade ou de superioridade hierárquica inerente ao exercício de emprego, cargo ou função
e.4) Houver retirada da vítima do território nacional
O legislador não aumentou a pena para o caso do indivíduo que trouxer a vítima do estado estrangeiro, ou seja, não aumenta a pena decorrente da “importação da vítima” para o tráfico internacional.
f) Causa de diminuição de pena (tráfico de pessoas minorado)
No §2º está estampada a figura do tráfico de pessoas minorado, estabelecendo a redução de 1/3 a 2/3, desde que o agente seja:
f.1) Primário
f.2) Não integre organização criminosa
Rogério Sanches entende que o juiz deverá considerar o grau maior ou menor de colaboração do agente para reduzir a pena, ou ainda o grau de submissão que foi colocada a vítima.
g) Ação penal e competência
- O crime é de ação penal pública incondicionada.
- A atribuição para investigação é da Polícia Civil, exceto se houver repercussão interestadual ou internacional, ocasião em que a apuração será deslocada para a Polícia Federal.
- A competência para julgamento do crime de tráfico de pessoas será da Justiça Estadual, exceto se houver a transnacionalização do delito, situação em que o crime será de competência da Justiça Federal.
h) Prescrição
- Se o tráfico de pessoas tiver a finalidade de exploração sexual, aplica-se o art. 111, V, do CP. Ou seja, se a vítima for criança ou adolescente, a prescrição somente começa a correr após atingir a maioridade, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal.
i) Livramento condicional
- O legislador mudou o livramento condicional do tráfico de pessoas. Ou seja, no crime de tráfico de pessoas deverá receber o mesmo tratamento dado ao livramento condicional dos crimes hediondos.
Portanto, o tráfico de pessoas, ainda que não se trate de crime hediondo ou de crime equiparado a hediondo, somente admitira o livramento condicional quando o agente tiver cumprido mais de 2/3 da pena, desde que o condenado não seja reincidente específico em crime hediondo ou equiparado.
j) Alienação antecipada de bens, direitos ou valores
- Segundo o art. 8º da Lei 13.344/16, o juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação do delegado de polícia, ouvido o Ministério Público, havendo indícios suficientes de infração penal, poderá decretar medidas assecuratórias relacionadas a bens, direitos ou valores pertencentes ao investigado ou acusado, ou existentes em nome de interpostas pessoas, que sejam instrumento, produto ou proveito do crime de tráfico de pessoas, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144-A do Código de Processo Penal.
- O §1º estabelece que será procedida alienação antecipada para preservação do valor dos bens sempre que estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção. O juiz determinará a liberação total ou parcial dos bens, direitos e valores quando comprovada a licitude de sua origem, mantendo-se a constrição dos bens, direitos e valores necessários e suficientes à reparação dos danos e ao pagamento de prestações pecuniárias, multas e custas decorrentes da infração penal.
- O §3º ressalta que nenhum pedido de liberação será conhecido sem o comparecimento pessoal do acusado ou investigado, ou de interposta pessoa, podendo o juiz determinar a prática de atos necessários à conservação de bens, direitos ou valores, sem prejuízo da alienação antecipada.
k) Meios de obtenção de prova da Lei de Organização Criminosa
- O art. 9º dispõe que se aplica, subsidiariamente, no que couber, o disposto na Lei de Organizações Criminosas (Lei 12.850/13).
- Se é permitida a aplicação subsidiária da Lei de Crime Organizado, isso significa que estão à disposição do Estado-Investigação os meios extraordinários de obtenção de prova lá albergados, tais como:
1- Colaboração premiada
2- Ação controlada
3- Infiltração de agentes
4- Captação ambiental de comunicações
l) Alterações do CPP
- Segundo o artigo 13-A do CPP, o membro do Ministério Público ou o Delegado de Polícia pode requisitar, de quaisquer órgãos do poder público ou de empresas da iniciativa privada, dados e informações cadastrais da vítima ou de suspeitos, desde que se trate dos crimes de:
1- Sequestro e cárcere privado (art. 148 do CP)
2- Redução a condição análoga à de escravo (art. 149 do CP)
3- Tráfico de pessoas (art. 149-A do CP)
4- Sequestro relâmpago (art. 158, §3º do CP)
5- Extorsão mediante sequestro (art. 159 do CP)
6- Envio ilegal de criança ou adolescente para o exterior (art. 239 do ECA)
REBECA CORRÊA
ADVOGADA
PÓS GRADUANDA EM CIÊNCIAS CRIMINAIS - PUC
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